15 de outubro de 2020

Excelente quinta

 



“Palavras”, by Anne Sexton


Tenha cuidado com as palavras,

mesmo as milagrosas.

Pelas milagrosas fazemos o melhor,

às vezes elas são como um enxame de insetos

e não nos picam, mas nos beijam.

Podem ser tão boas quanto dedos.

Tão seguras quanto as pedras

em que você senta.

Mas podem ser margaridas e feridas ao mesmo tempo.

Contudo, estou apaixonada pelas palavras.

São pombas caindo pelo teto.

São seis laranjas sagradas sobre meu colo.

São árvores, as pernas do verão,

e o sol, e sua face impetuosa.

E assim mesmo elas me falham.

Há tanta coisa que quero dizer,

tantas histórias, imagens, provérbios etc.

Mas as palavras não são boas o suficiente,

as erradas me beijam.

Às vezes voo como uma águia,

mas minhas asas são de carriça.

Mas eu tento cuidar

e ser gentil com elas.

Palavras e ovos devem ser manipulados com cuidado.

Uma vez quebrados são coisas impossíveis

de se reparar.


- - -


“Words”, by Anne Sexton


Be careful of words,

even the miraculous ones.

For the miraculous we do our best,

sometimes they swarm like insects

and leave not a sting but a kiss.

They can be as good as fingers.

They can be as trusty as the rock

you stick your bottom on.

But they can be both daisies and bruises.

Yet I am in love with words.

They are doves falling out of the ceiling.

They are six holy oranges sitting in my lap.

They are the trees, the legs of summer,

and the sun, its passionate face.

Yet often they fail me.

I have so much I want to say,

so many stories, images, proverbs, etc.

But the words aren’t good enough,

the wrong ones kiss me.

Sometimes I fly like an eagle

but with the wings of a wren.

But I try to take care

and be gentle to them.

Words and eggs must be handled with care.

Once broken they are impossible

things to repair.



FIO PARTIDO

Fugir à mágoa terrena

E ao sonho, que faz sofrer,

Deixar o mundo sem pena

Será morrer?


Fugir neste anseio infindo

À treva do anoitecer,

Buscar a aurora sorrindo

Será morrer?


E ao grito que a dor arranca

E o coração faz tremer,

Voar uma pomba branca

Será morrer?


II


Lá vai a pomba voando

Livre, através dos espaços...

Sacode as asas cantando:

"Quebrei meus laços!"


Aqui na amplidão liberta,

Quem pode deter-me os passos?

Deixei a prisão deserta,

Quebrei meus laços!


Jesus, este vôo infindo

Há de amparar-me nos braços

Enquanto eu direi sorrindo:

Quebrei meus laços!


Janeiro, 1901



In: SOUSA, Auta de. Horto. 4.ed. Natal: Fundação José Augusto, 197


BOÊMIAS

A Rosa Monteiro



Quando me vires chorar,

Que sou infeliz não creias;

Eu choro porque no Mar

Nem sempre cantam sereias.


Choro porque, no Infinito,

As estrelas luminosas

Choram o orvalho bendito,

Que faz desabrochar as rosas.


Do lábio o consolo santo

É o riso que vem cantando...

O riso do olhar é o pranto:

Meus olhos riem chorando.


O seio branco da aurora

Derrama orvalhos a flux...

O círio que brilha chora:

A dor também fere a luz?


Teus olhos cheios de ardores

Aninham rosas nas faces...

Que seria dessas flores,

Responde, se não chorasse?



In: SOUSA, Auta de. Horto. 4.ed. Natal: Fundação José Augusto, 197


SÚPLICA

Se tudo foge e tudo desaparece,

Se tudo cai ao vento da Desgraça,

Se a vida é o sopro que nos lábios passa

Gelando o ardor da derradeira prece;


Se o sonho chora e geme e desfalece

Dentro do coração que o amor enlaça,

Se a rosa murcha inda em botão, e a graça

Da moça foge quando a idade cresce;


Se Deus transforma em sua lei tão pura

A dor das almas que o Ideal tortura

Na demência feliz de pobres loucos...


Se a água do rio para o oceano corre,

Se tudo cai, Senhor! por que não morre

A dor sem fim que me devora aos poucos?



In: SOUSA, Auta de. Horto. 4.ed. Natal: Fundação José Augusto, 197


NUNCA MAIS

...Il n'est plus dans mon coeur

Une fibre que n'ait résonné sa Douleur.

LAMARTINE - Harmonies


Que é feito de meu sonho, um sonho puro

Feito de rosa e feito de alabastro,

Quimera que brilhava, como um astro,

Pela noite sem fim do meu futuro?


Que é feito deste sonho, o cofre aberto

Que recebia as gotas de meu pranto,

Bagas de orvalho, folhas de amaranto,

Perdidas na solidão de meu deserto?


Ele passou como uma nuvem passa,

Roçando o azul em flor do firmamento...

Ele partiu, e apenas o tormento,

Sobre minh'alma triste, inda esvoaça.


Meu casto sonho! Lá se foi cantando,

Talvez em busca de uma pátria nova.

Deixou-me o coração como uma cova,

E, dentro dele, o meu amor chorando.


Nunca mais voltará... Pois, que lhe importa

Esta morada lúgubre e sombria?

Não pode agasalhar uma alegria

Minh'alma, pobre morta!



In: SOUSA, Auta de. Horto. 4.ed. Natal: Fundação José Augusto, 197


NUM LEQUE

Na gaze loura deste leque adeja

Não sei que amora místico e encantado...

Doce morena! Abençoado seja

O doce aroma de teu leque amado


Quando o entreabres, a sorrir, na Igreja,

O templo inteiro fica embalsamado...

Até minh'alma carinhosa o beija,

Como a toalha de um altar sagrado.


E enquanto o aroma inebriante voa,

Unido aos hinos que, no coro, entoa

A voz de um órgão soluçando dores,


Só me parece que o choroso canto

Sobe da gaze de teu leque santo,

Cheio de luz e de perfume e flores!



In: SOUSA, Auta de. Horto. 4.ed. Natal: Fundação José Augusto, 1972

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Agradecemos pela leitura.

Biografia quase completa






Escritor, locador, vendedor de livros, protético dentário pela SPDERJ, consultor e marketing na Editora Becalete e entusiasta pelas Artes com uma tela no acervo permanente do Museu de Arte Contemporânea da Bahia (MAC/BA)

Autor de sete livros solo em papel, um em e-book e coautor em mais de 130 Antologias poéticas

Livros:
• Poeteideser de 2009 (edição do autor)
• O e-book Imaginação Poética 2010 (Beco dos Poetas)
• A trilogia poética Fulano da Silva, Sicrano Barbosa e Beltrano dos Santos de 2014
• Puro Osso – duzentos escritos de paixão (março de 2015)
• Gaveta de Cima – versos seletos, patrocinado pela Editora Darda (Setembro de 2017)
• Absolvido pela Loucura; Absorvido pela Arte
(Janeiro de 2019)

• O livro de duetos: A Luz e o Diamante (Junho 2015)
• O livro em trio: ABC Tríade Poética (Novembro de 2015)

Amigos das Letras:
• Membro vitalício da Academia de Artes, Ciências e Letras de Iguaba (RJ) cadeira N° 95
• Membro vitalício da Academia Virtual de Letras, Artes e Cultura da Embaixada da Poesia (RJ)
• Membro vitalício e cofundador da Academia Internacional da União Cultural (RJ) cadeira N° 63
• Membro correspondente da ALB seccionais Bahia, São Paulo (Araraquara), da Academia de Letras de Goiás (ALG) e do Núcleo de Letras e Artes de Lisboa (PT)
• Membro da Academia Internacional De Artes, Letras e Ciências – ALPAS 21 - Patrono: Condorcet Aranha

Trupe Poética:
• Academia Virtual de Escritores Clandestinos
• Elo Escritor da Elos Literários
• Movimento Nacional Elos Literários
• Poste Poesia
• Bar do Escritor
• Pé de Poesia
• Rio Capital da Poesia
• Beco dos Poetas
• Poemas à Flor da Pele
• Tribuna Escrita
• Jornal Delfos/CE
• Colaborador no Portal Cronópios 2015
• Projeto Meu Poemas do Beco dos Poetas

Antologias Virtuais Permanentes:
• Portal CEN (Cá Estamos Nós - Brasil/Portugal)
• Logos do Portal Fénix (Brasil/Portugal)
• Revista eisFluências (Brasil/Portugal)
• Jornal Correio da Palavra (ALPAS 21)

Concursos, Projetos e Afins:
• Menção Honrosa do 2° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Brava Gente Brasileira”.
• Menção Honrosa do 4° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Amor do Tamanho do Brasil”.
• Menção Honrosa do 5° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Quem acredita cresce”.
• Menção Honrosa no I Prêmio Literário Mar de Letras, com poetas de Moçambique, Portugal e Brasil, ficou entre os 46 primeiros e está no livro “Controversos” - E. Sapere
• classificado no Concurso Novos Poetas com poema selecionado para o livro Poetize 2014 (Concurso Nacional Novos Poetas)
• 3° Lugar no Concurso Literário “Confrades do Verso”.
• indicado e outorgado com o título de "Participação Especial" na Antologia O Melhor de Poesias Encantadas/Salvador (BA).
• indicado e outorgado com o título de "Talento Poético 2015" com duas obras selecionadas para a Antologia As Melhores Poesias em Língua Portuguesa (SP).
• indicado e outorgado com o título de Talento Poético 2016 e 2017 pela Editora Becalete
• indicado e outorgado com o título de "Destaque Especial 2015” na Antologia O Melhor de Poesias Encantadas VIII
• Revisor, jurado e coautor dos tomos IX e X do projeto Poesias Encantadas
• Teve poemas selecionados e participou da Coletânea de Poesias "Confissões".
• Dois poemas selecionados e participou da Antologia Pablo Neruda e convidados (Lançada em ago./14 no Chile, na 23a Bienal (SP) e em out/14 no Museu do Oriente em Lisboa) - pela Literarte

André Anlub por Ele mesmo: Eu moro em mim, mas costumo fugir de casa; totalmente anárquico nas minhas lucidezes e pragmático nas loucuras, tento quebrar o gelo e gaseificar o fogo; não me vendo ao Sistema, não aceito ser trem e voo; tenho a parcimônia de quem cultiva passiflora e a doce monotonia de quem transpira melatonina; minha candura cascuda e otimista persistiu e venceu uma possível misantropia metediça e movediça; otimista sem utopia, pessimista sem depressão. Me considero um entusiasta pela vida, um quase “poète maudit” e um quase “bon vivant”.

Influências – atual: Neruda, Manoel de Barros, Sylvia Plath, Dostoiévski, China Miéville, Emily Dickinson, Žižek, Ana Cruz Cesar, Drummond
Hobbies: artes plásticas, gastronomia, fotografia, cavalos, escrita, leitura, música e boxe.
Influências – raiz: Secos e Molhados, Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Mutantes, Jorge Amado, Neil Gaiman, gibis, Luiz Melodia entre outros.
Tem paixão pelo Rock, MPB e Samba, Blues e Jazz, café e a escrita. Acredita e carrega algumas verdades corriqueiras como amor, caráter, filosofia, poesia, música e fé.