10 de julho de 2018

Ótima noite queridos amigos


Copo de plástico

E vai o ar mais quente do verão,
Pelos espaços em brancos, pelas alamedas vazias,
Nas narinas dos santos e dos pecadores.

Vai um filete de água descendo o canto da calçada,
Leva um copo de plástico; talvez leve um vulto sagrado.
No velho casebre o homem esculpe uma cálida imagem,
Que logo, em breve – quem sabe, esboçará uma crença.

No campo azul lá em cima, há gritos de prosperidade...
No palco azul piscina, no alto, no voo e no espaço.

Ninguém mais chega ao ponto, na resposta da longa pergunta...
Numa desconexa permuta de línguas encafifadas rescendentes.

No lago verde, verdinho, com vitórias-régias, peixes gordos e belos...
Alarga a reflexão, vem junto em coroação, um pedinte pé de chinelo.

E vai o ar mais frio de inverno,
Alavancando sua marcha pelo horizonte mais gélido;
Dentro de um copo de plástico, dentro da velha cachaça,
Do pedinte pé de chinelo.

André Anlub
(13/1/15)


Doce Poesia Doce




Alguns poemas dos famosos


Cenário
Cecília Meireles

Passei por essas plácidas colinas
e vi das nuvens, silencioso, o gado,
pascer nas solidões esmeraldinas.

Largos rios de corpo sossegado
dormiam sobre a tarde, imensamente,
e eram sonhos sem fim, de cada lado.

Entre nuvens, colinas e torrente,
uma angústia de amor estremecia
a deserta amplidão na minha frente.

Que vento, que cavalo, que bravia
saudade me arrastava a esse deserto,
me obrigava a adorar o que sofria?

Passei por entre as grotas negras, perto
dos arroios fanados, do cascalho
cujo ouro já foi todo descoberto.

As mesmas salas deram-me agasalho
onde a face brilhou de homens antigos,
iluminada por aflito orvalho.

De coração votado a iguais perigos,
vivendo as mesmas dores e esperanças,
a voz ouvi de amigos e inimigos.

Vencendo o tempo, fértil em mudanças,
conversei com doçura as mesmas fontes,
e vi serem comuns nossas lembranças.

Da brecha tenebrosa aos curvos montes,
do quebrado almocafre aos anjos de ouro
que o céu sustêm nos longos horizontes,

tudo me fala e entende do tesouro
arrancado a estas Minas enganosas,
com sangue sobre a espada, a cruz e o louro.

Tudo me fala e entendo: escuto as rosas
e os girassóis destes jardins, que um dia
foram terras e areias dolorosas,

por onde o passo da ambição rugia;
por onde se arrastava, esquartejado,
o mártir sem direito de agonia.

Escuto os alicerces que o passado
tingiu de incêndio: a voz dessas ruínas
de muros de ouro em fogo evaporado.

Altas capelas contam-me divinas
fábulas. Torres, santos e cruzeiros
apontam-me altitudes e neblinas.

Ó pontes sobre os córregos! ó vasta
desolação de ermas, estéreis serras
que o sol freqüenta e a ventania gasta!

Rubras, cinéreas, tenebrosas terras
retalhadas, por grandes golpes duros,
de infatigáveis, seculares guerras...

Tudo me chama: a porta, a escada, os muros,
as lajes sobre mortos ainda vivos,
dos seus próprios assuntos inseguros.

Assim viveram chefes e cativos,
um dia, neste campo, entrelaçados
na mesma dor, quiméricos e altivos.

E assim me acenam por todos os lados.
Porque a voz que tiveram ficou presa
na sentença dos homens e dos fados.

Cemitério das almas... – que tristeza
nutre as papoulas de tão vaga essência?
(Tudo é sombra de sombras, com certeza...

O mundo, vaga e inábil aparência,
que se perde nas lápides escritas,
sem qualquer consistência ou conseqüência.

Vão-se as datas e as letras eruditas
na pedra e na alma, sob etéreos ventos,
em lúcidas venturas e desditas.

E são todas as coisas uns momentos
de perdulária fantasmagoria
– jogo de fugas e aparecimentos.)

Das grotas de ouro à extrema escadaria,
por asas de memória e de saudade,
com o pó do chão meu sonho confundia.

Armado pó que finge eternidade,
lavra imagens de santos e profetas
cuja voz silenciosa nos persuade.

E recompunha as coisas incompletas:
figuras inocentes, vis, atrozes,
vigários, coronéis, ministros, poetas.

Retrocedem os tempos tão velozes,
que ultramarinos árcades pastores
falam de Ninfas e Metamorfoses.

E percebo os suspiros dos amores
quando por esses prados florescentes
se ergueram duros punhos agressores.

Aqui tiniram ferros de correntes;
pisaram por ali tristes cavalos.
E enamorados olhos refulgentes

– parado o coração por escutá-los –
prantearam nesse pânico de auroras
densas de brumas e gementes galos.

Isabéis, Dorotéias, Eliodoras,
ao longo desses vales, desses rios,
viram as suas mais douradas horas

em vasto furacão de desvarios
vacilar como em caules de altas velas
cálida luz de trêmulos pavios.

Minha sorte se inclina junto àquelas
vagas sombras da triste madrugada,
fluidos perfis de donas e donzelas.

Tudo em redor é tanta coisa e é nada:
Nise, Anarda, Marília... – quem procuro?
Quem responde a essa póstuma chamada?

Que mensageiro chega, humilde e obscuro?
Que cartas se abrem? Quem reza ou pragueja?
Quem foge? Entre que sombras me aventuro?

Que soube cada santo em cada igreja?
A memória é também pálida e morta
sobre a qual nosso amor saudoso adeja.

O passado não abre a sua porta
e não pode entender a nossa pena.
Mas, nos campos sem fim que o sonho corta,

vejo uma forma no ar subir serena:
vaga forma, do tempo desprendida.
É a mão do Alferes, que de longe acena.

Eloqüência da simples despedida:
”Adeus! que trabalhar vou para todos!...”
(Esse adeus estremece a minha vida.)

Fonte: Moriconi, I. 2001. Os cem melhores poemas brasileiros do século. RJ, Objetiva. Este poema integra o Romanceiro da Inconfidência, obra originalmente publicada em 1953.


Também já fui brasileiro

Eu também já fui brasileiro
moreno como vocês.
Ponteei viola, guiei forde
e aprendi na mesa dos bares
que o nacionalismo é uma virtude.
Mas há uma hora em que os bares se fecham
e todas as virtudes se negam.

Eu também já fui poeta.
Bastava olhar para mulher,
pensava logo nas estrelas
e outros substantivos celestes.
Mas eram tantas, o céu tamanho,
minha poesia perturbou-se.

Eu também já tive meu ritmo.
Fazia isso, dizia aquilo.
E meus amigos me queriam,
meus inimigos me odiavam.
Eu irônico deslizava
satisfeito de ter meu ritmo.
Mas acabei confundindo tudo.
Hoje não deslizo mais não,
não sou irônico mais não,
não tenho ritmo mais não.

Carlos Drummond de Andrade Andrade, C. D. Sentimento do Mundo, 1940.

9 de julho de 2018

Na ponta da língua os amores; no resto da boca as paixões


Na ponta da língua os amores; no resto da boca as paixões
(manhã de 9 de julho de 2015)

Já não seria de ontem, de hoje, tampouco sonho ou alucinação. Vejo os sorrisos e os prantos, juntos, balanceados e divididos pela emoção. É digno como pimenta calabresa temperando meu peixe de domingo – de segunda –, até sexta. Fato armado, direto, explícito... Poesia faz isso comigo: me esfaqueia, me beija, quebra meu queixo com um soco direto no queixo – nem me queixo –, me quebra ao meio, me quebra em meio à calmaria – quer que eu chore ou ria –, me flecha e me fecha com uma placa escrito: rua sem saída (mas com saída... e muitas, de todos os jeitos). O básico já estaria de bom tamanho: amá-la mais que tudo. Mas vislumbra-se mais e mais, vislumbra-se tudo – goiabada com queijo, e de búfala. Facas, faces, inicialmente e finalmente nas entrefazes da escultura do próprio ser; seria um ser mutante? Seria um ser pensante? Já não se sabe o que seria e nem sei o que eu seria sem poesia (e nem quero saber! mas não espalha). Abro as cortinas do agora, do agito, da zorra, da zorra, mas que zorra... Vejo-me escrevendo em uma praia quase deserta; vejo-me de sunga escura, ou azul, verde e amarela; sunga branca, pronto – ponto! Os pés sujos de areia, o mar batendo calmo, uma sereia (ai já é sonho, ou vai dar samba), o sol de começo de dia, gaivotas voando, e só o som do mar (que não é samba). Dentro da minha mente um grito em cântico, um toque alto – mas baixo –, para não atrapalhar. No bloquinho nada branquinho meus emblemas, meus problemas, esquemas, “esquentas” e soluções; em ação minha observação de tudo que chega a conclusão de nada; minha vida exposta, mas um outro Eu que já nasceu ou vai nascer, em outra encarnação... tudo fingido e tingido, pintado de prata e todas as cores, e emoldurado e endiabrado e com um som de fundo... tudo junto aos talheres e saladas, aos copos com vinho tinto e um tanto de pães de "alhos" – e algo (s) mais – tudo cercado por pinturas, partituras, e Beethoven e cães latindo e cães felizes e mendigando uns pedaços... tudo na mesa... absolutamente tudo na mesa... com um toque de azeite extra virgem e pimenta calabresa... tudo na mesa.

André Anlub

Das insônias


Das insônias

Geralmente fica rolando de um lado para o outro na cama
Tira o travesseiro, troca o travesseiro e barriga pra cima
Coçam os olhos, as pálpebras ficam pesadas e ele boceja
Conta carneirinhos se imagina em uma praia ou com porcos na lama.

São números e contas que passam à sua frente
E como um doente, não consegue expurgar seus pensamentos
São vários momentos que se tornam um desagradável filme 
Queria ter um botão de “on e off” para ajuizar sua mente.

Se levanta, vai beber uma água e depois ao banheiro
E o comprimido que era só a metade e já tomou um inteiro
Já bebeu chá, maracujá e até Almeida Prado
Pensa o que teria feito de ruim para carregar esse fardo.

A claridade começa a entrar pela fresta da janela
O galo começa a ensaiar sua apresentação
O vizinho já esquenta o carro para ir labutar.
E ele pensando: agora vale à pena dormir, ou não?


André Anlub


Piada da Velha República.

O ladrão entra na casa e começa a fazer a limpeza, então ouve uma voz que diz:
— Jesus está te vendo.
Assustado o ladrão procura quem falou isso e encontra um papagaio que repete:
— Jesus está te vendo!
O ladrão ri e pergunta:
— Quem foi o idiota que colocou o nome de Jesus em um papagaio?
E o papagaio responde.
— Eu sou Judas, idiota. Jesus é o pitbull!


8 de julho de 2018

Das Loucuras (estoico, apostador, caótico, profano)


Das Loucuras (estoico, apostador, caótico, profano)

Ecos do provisório do cabelo escovado
E o corpo com cheiro de talco.
No papel o roteiro com o fim e o meio esperando o início.
Pés aquecidos em sapatos italianos bico fino...
“Pisantes” comprados de um índio.
O sal na boca e o céu acima,
“Biloucos” com o sangue cheio de álcool.

A plateia aperta o cinto,
Pois o espetáculo vai durar mais uns dias...
Uns dizem se tratar de rebeldia,
Outros se tratam com remédio num terreno baldio.

Cascalhos pelo chão e cães magros no pedaço compõem o cenário.
Sim, tem algo estranho no ar! 
Alguém levanta uma placa pedindo gás do riso.

Na sequencia a consequência de não ter se separado do seu vício:
Viveu sua vida de vidro, tomou chá de presença e de sumiço.
Gritou nu pelas ruas, pois o silêncio o fazia deprimido.

Nunca esteve sozinho,
Meio mundo copiava seus caminhos.

Na rebeldia do seu tempo, na inércia da solidão,
Desvendou criptogramas, leu dicionários, diários, Bíblia, Alcorão.

Apostou em si mesmo, perdeu tudo que tinha;
Fez-se rico com pouco, conheceu sua sina.
Olha no espelho com orgulho, vê o quer encontrar...
Perdeu a necessidade inútil de sempre sorrir e agradar.

André Anlub
(8/7/18)

Biografia quase completa






Escritor, locador, vendedor de livros, protético dentário pela SPDERJ, consultor e marketing na Editora Becalete e entusiasta pelas Artes com uma tela no acervo permanente do Museu de Arte Contemporânea da Bahia (MAC/BA)

Autor de sete livros solo em papel, um em e-book e coautor em mais de 130 Antologias poéticas

Livros:
• Poeteideser de 2009 (edição do autor)
• O e-book Imaginação Poética 2010 (Beco dos Poetas)
• A trilogia poética Fulano da Silva, Sicrano Barbosa e Beltrano dos Santos de 2014
• Puro Osso – duzentos escritos de paixão (março de 2015)
• Gaveta de Cima – versos seletos, patrocinado pela Editora Darda (Setembro de 2017)
• Absolvido pela Loucura; Absorvido pela Arte
(Janeiro de 2019)

• O livro de duetos: A Luz e o Diamante (Junho 2015)
• O livro em trio: ABC Tríade Poética (Novembro de 2015)

Amigos das Letras:
• Membro vitalício da Academia de Artes, Ciências e Letras de Iguaba (RJ) cadeira N° 95
• Membro vitalício da Academia Virtual de Letras, Artes e Cultura da Embaixada da Poesia (RJ)
• Membro vitalício e cofundador da Academia Internacional da União Cultural (RJ) cadeira N° 63
• Membro correspondente da ALB seccionais Bahia, São Paulo (Araraquara), da Academia de Letras de Goiás (ALG) e do Núcleo de Letras e Artes de Lisboa (PT)
• Membro da Academia Internacional De Artes, Letras e Ciências – ALPAS 21 - Patrono: Condorcet Aranha

Trupe Poética:
• Academia Virtual de Escritores Clandestinos
• Elo Escritor da Elos Literários
• Movimento Nacional Elos Literários
• Poste Poesia
• Bar do Escritor
• Pé de Poesia
• Rio Capital da Poesia
• Beco dos Poetas
• Poemas à Flor da Pele
• Tribuna Escrita
• Jornal Delfos/CE
• Colaborador no Portal Cronópios 2015
• Projeto Meu Poemas do Beco dos Poetas

Antologias Virtuais Permanentes:
• Portal CEN (Cá Estamos Nós - Brasil/Portugal)
• Logos do Portal Fénix (Brasil/Portugal)
• Revista eisFluências (Brasil/Portugal)
• Jornal Correio da Palavra (ALPAS 21)

Concursos, Projetos e Afins:
• Menção Honrosa do 2° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Brava Gente Brasileira”.
• Menção Honrosa do 4° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Amor do Tamanho do Brasil”.
• Menção Honrosa do 5° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Quem acredita cresce”.
• Menção Honrosa no I Prêmio Literário Mar de Letras, com poetas de Moçambique, Portugal e Brasil, ficou entre os 46 primeiros e está no livro “Controversos” - E. Sapere
• classificado no Concurso Novos Poetas com poema selecionado para o livro Poetize 2014 (Concurso Nacional Novos Poetas)
• 3° Lugar no Concurso Literário “Confrades do Verso”.
• indicado e outorgado com o título de "Participação Especial" na Antologia O Melhor de Poesias Encantadas/Salvador (BA).
• indicado e outorgado com o título de "Talento Poético 2015" com duas obras selecionadas para a Antologia As Melhores Poesias em Língua Portuguesa (SP).
• indicado e outorgado com o título de Talento Poético 2016 e 2017 pela Editora Becalete
• indicado e outorgado com o título de "Destaque Especial 2015” na Antologia O Melhor de Poesias Encantadas VIII
• Revisor, jurado e coautor dos tomos IX e X do projeto Poesias Encantadas
• Teve poemas selecionados e participou da Coletânea de Poesias "Confissões".
• Dois poemas selecionados e participou da Antologia Pablo Neruda e convidados (Lançada em ago./14 no Chile, na 23a Bienal (SP) e em out/14 no Museu do Oriente em Lisboa) - pela Literarte

André Anlub por Ele mesmo: Eu moro em mim, mas costumo fugir de casa; totalmente anárquico nas minhas lucidezes e pragmático nas loucuras, tento quebrar o gelo e gaseificar o fogo; não me vendo ao Sistema, não aceito ser trem e voo; tenho a parcimônia de quem cultiva passiflora e a doce monotonia de quem transpira melatonina; minha candura cascuda e otimista persistiu e venceu uma possível misantropia metediça e movediça; otimista sem utopia, pessimista sem depressão. Me considero um entusiasta pela vida, um quase “poète maudit” e um quase “bon vivant”.

Influências – atual: Neruda, Manoel de Barros, Sylvia Plath, Dostoiévski, China Miéville, Emily Dickinson, Žižek, Ana Cruz Cesar, Drummond
Hobbies: artes plásticas, gastronomia, fotografia, cavalos, escrita, leitura, música e boxe.
Influências – raiz: Secos e Molhados, Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Mutantes, Jorge Amado, Neil Gaiman, gibis, Luiz Melodia entre outros.
Tem paixão pelo Rock, MPB e Samba, Blues e Jazz, café e a escrita. Acredita e carrega algumas verdades corriqueiras como amor, caráter, filosofia, poesia, música e fé.