A epopeia de Denise e do Dono (caixa de Pandora - 5/5/10)
Denise caminha em uma praia e mesmo que o sol não raia sua alegria insiste e num instante depara-se com uma caixa, um baú velho e pequeno. O abre, deixando escapar um vento, em vulto, um veneno.
A caixa: dentro havia um sonho que a remeteu a outros lugares; voava por entre vales, sentia na face leve brisa gélida; despiu-se de todos os seus disfarces, reviu todos que já se foram e todos que por ela eram amados e ela por eles. Viu a morte que passou tão rápida e inexpressiva que na verdade poderia se tratar de uma nuvem negra: nuvem pequena – inútil –, essa nuvem que não faz chuva, mas, dependendo do ponto de vista, pode tirar o reinado do sol. Voou sobre a ilha de Páscoa e sorriu para seus mistérios; atravessou deltas de rios, do Parnaíba ao Nilo. Ao anoitecer viu Paris, sentiu seus perfumes e por um momento os odores a levaram a campos, como se estivesse presa numa redoma de vidro; foi testemunha do nascimento de uma pequena aldeia: África. Os lugares voltavam no tempo, homens surgiam em grupos, perseguiam mamutes e comiam famintos... descobriam o fogo – violência – pretensão. Ninguém podia vê-la ou ouvi-la, e tantas coisas para ensinar e aprender. De repente, tudo foi simplificado a um só casal de humanos, uma árvore, uma fruta, uma cobra – voltando em segundos ao atual e normal. Pode ver tanta coisa e estar em tantos lugares, mas ao retornar desse sonho tão real a realidade maior a esperava: ela não pode encontrar quem seria prioritário, quem responderia suas recentes e antigas perguntas, quem a acolheria e daria afagos e força, quem a conhecia como ninguém... ninguém mais que, talvez... talvez, ela mesma.
O Dono
Pulando de nuvem em nuvem,
Jogando bola com o sol;
Pintei o arco Iris de preto
E mostrei a língua pro furacão.
Usando um vulcão de privada,
Canal do Panamá de piscina,
Posso estar em qualquer estrada,
Posso dobrar qualquer esquina.
Eu uso a Itália de bota,
Bebo a Via Láctea no café;
Sou Deus que troca Vênus pela Lua
E depois me escondo onde quiser.
Tudo posso e faço
Tudo com minha criação
Poeta da tinta e do espaço
Sou dono da imaginação.
Buscando plenitude e paz no dia a dia,
Nas águas límpidas do saber viver,
Achando sempre muito mais,
É assim que tem que ser.
Choro por muitas vezes sem motivo,
Posso chorar por você!
Estendo a mão a qualquer inimigo,
Simplesmente por não aguentar vê-lo sofrer.
A Lua e o Sol se completam,
Mesmo sem se tocarem;
Faço inimagináveis incógnitas,
Sou vultos por todos os lugares.
Quebro a barreira do som,
Posso fazê-lo ou não,
Mas mostro o poder maior
Que é grande nesse meu dom.
Falo em línguas estranhas,
Olho por todos os ângulos,
Dono de todos os tesouros,
Mestre de todas as façanhas.
O som das ondas é meu grito,
Refugio das manhãs tristes,
Um vulcão que sangra com meu sangue,
Dias mais que felizes.
Deito-me devagar vendo a terra tremer,
Sempre ao levantar, meu suor, orvalho.
Piso na neve para fazer planícies
E com poesia choro chuvas sem querer.
Na escuridão de um fechar de olhos,
Pensamentos voam como falcão,
Vagueiam em um amor que nunca existiu,
Falhas de canyons, rachaduras do coração.
Estar irritado é impossível,
Extinguirá a vida e o mundo;
Sou totalmente previsível,
Nunca serei um moribundo.
Acordei um pouco cansado,
Pensei em apagar o sol;
Dei um sorriso mal humorado,
Fui caminhar dormindo acordado.
Bebi toda água do rio Negro,
Usei uma nuvem como espuma de barbear,
Subi no cume do Everest buscando sossego,
Mas já havia gente por lá.
Com uma pirâmide palitei meu dente,
Usei o lago Ness como espelho d’água,
Fui para o Aconcágua, mas também havia gente,
E lá rio Tâmisa afoguei minhas mágoas.
Posso ser o dono, mas mesmo assim sou gente,
Crio o universo, mas também me enfastio.
Vou já indo para Marte como um indigente,
Gritar feito louco como uma gata no cio.
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