7 de julho de 2018

Ótimo final de tarde


CAZUZA
(04/04/1958 – 07/07/1990)

texto de Jorge Sanglard
Jornalista e pesquisador. Escreve em jornais de Portugal e do Brasil.

Agenor de Miranda Araújo Neto passou como um cometa chamado Cazuza e em seu rastro fica a certeza de que valeu a pena ser um porta-voz de um tempo difícil. Afiado e afinado com seu tempo, Cazuza, nascido em 4 de abril de 1958, teria feito 60 anos, se não estivesse se encantado, em 7 de julho de 1990, há 28 anos, no Rio de Janeiro, deixando flagrante a fragilidade do vigor físico mostrado no início da carreira musical, ao lado do Barão Vermelho, mas em nenhum momento de sua luta pela vida abandonou a contundência, a ironia e a mordacidade; batendo fundo e certeiro na hipocrisia.
Com a cara e a coragem, Cazuza desafiou a tudo e a (quase) todos e graças a sua assumida postura de exagerado, despertou ora amor, ora ódio, mas nunca a indiferença. Mesmo nas horas mais difíceis e dramáticas, o cantor e compositor rejeitou a cômoda atitude da condescendência e, apesar de tudo, fez questão de alternar imperfeições com a maturidade poética e a densidade sonora, traçando um vigoroso mosaico de nossas misérias pessoais e sociais, sempre desafi(n)ando o coro dos contentes.
Cazuza foi à luta e com uma poética sem meias palavras e uma sonoridade simples, mas eficiente, deixou uma contribuição importante para a música brasileira contemporânea que, muitas vezes, teima em não deixar fluir a voz que vem de dentro e insiste em repetir as gastas fórmulas lá de fora.
Enquanto teve forças, Cazuza viveu intensamente e se afirmou como um dos mais criativos músicos da nova geração da música brasileira. Isto não o isenta de equívocos, pelo contrário, apenas atesta a sua luta para não se render, nem ao apelo fácil da pasteurização musical, nem à diluição de sua proposta. Cazuza nunca se cansou de dizer que não queria compromisso com nada, a não ser com a vida.
Hoje, não vem mais ao caso se Cazuza cantava bem ou mal, importa só que sua obra está aí viva, contundente e coerente com a sua trajetória na música brasileira.
Em seus discos, Cazuza foi deixando pistas preciosas de suas intenções e engendrou um verdadeiro quebra-cabeças onde peça por peça se encaixa e aponta o rumo preciso.
Em seu último álbum “Burguesia” o cantor e compositor deixou uma dessas pistas na canção “Cartão Postal”, onde revela (in)confidências: “Pra que / Sofrer com despedida? / Se quem parte não leva, / nem o sol nem as trevas / E quem fica não se esquece / Tudo que sonhou, I now / Tudo é tão simples / Que cabe num cartão postal / E se a história é de amor / Não pode acabar mal / O adeus traz a esperança escondida / Pra que sofrer com despedida? / Se só vai quem chegou, e quem vem vai partir / Você sofre, se lamenta, depois vai dormir / Sabe; / Alguém quando parte / É porque outro alguém vai chegar / Num raio de lua, na esquina, no vento ou no mar / Pra que querer ensinar a vida? / Pra que sofrer com despedida”.
Cazuza não vai mais se expor, sua música agora vai ocupar todo o espaço deixado pelo cantor e compositor, que soube dosar a corrosiva carga de seu canto, num momento em que ‘as ilusões estão todas perdidas’. Afinal, seus heróis morreram todos de overdose, seus inimigos estavam no poder e seu prazer virou risco de vida.
Mesmo não pretendendo empunhar bandeira alguma, a força de sua canção e o seu recado seguro e indignado acabaram por empurrar Cazuza para o centro de outras lutas.
Sua canção “Brasil” se tornou um retrato em branco e preto da trágica realidade nacional de seu tempo, onde Cazuza cobrou alto seu inconformismo: “Brasil / mostra a tua cara / quero ver quem paga / pra gente ficar assim...”.
Quem apontou o dedo tão firme para a ferida não está mais entre nós para ver quem é que vai pagar pelo que fizeram desde então com o Brasil. Com a morte de Cazuza, morreu também um pedaço da indignação brasileira. Morreu um poeta da indignação.

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Biografia quase completa






Escritor, locador, vendedor de livros, protético dentário pela SPDERJ, consultor e marketing na Editora Becalete e entusiasta pelas Artes com uma tela no acervo permanente do Museu de Arte Contemporânea da Bahia (MAC/BA)

Autor de sete livros solo em papel, um em e-book e coautor em mais de 130 Antologias poéticas

Livros:
• Poeteideser de 2009 (edição do autor)
• O e-book Imaginação Poética 2010 (Beco dos Poetas)
• A trilogia poética Fulano da Silva, Sicrano Barbosa e Beltrano dos Santos de 2014
• Puro Osso – duzentos escritos de paixão (março de 2015)
• Gaveta de Cima – versos seletos, patrocinado pela Editora Darda (Setembro de 2017)
• Absolvido pela Loucura; Absorvido pela Arte
(Janeiro de 2019)

• O livro de duetos: A Luz e o Diamante (Junho 2015)
• O livro em trio: ABC Tríade Poética (Novembro de 2015)

Amigos das Letras:
• Membro vitalício da Academia de Artes, Ciências e Letras de Iguaba (RJ) cadeira N° 95
• Membro vitalício da Academia Virtual de Letras, Artes e Cultura da Embaixada da Poesia (RJ)
• Membro vitalício e cofundador da Academia Internacional da União Cultural (RJ) cadeira N° 63
• Membro correspondente da ALB seccionais Bahia, São Paulo (Araraquara), da Academia de Letras de Goiás (ALG) e do Núcleo de Letras e Artes de Lisboa (PT)
• Membro da Academia Internacional De Artes, Letras e Ciências – ALPAS 21 - Patrono: Condorcet Aranha

Trupe Poética:
• Academia Virtual de Escritores Clandestinos
• Elo Escritor da Elos Literários
• Movimento Nacional Elos Literários
• Poste Poesia
• Bar do Escritor
• Pé de Poesia
• Rio Capital da Poesia
• Beco dos Poetas
• Poemas à Flor da Pele
• Tribuna Escrita
• Jornal Delfos/CE
• Colaborador no Portal Cronópios 2015
• Projeto Meu Poemas do Beco dos Poetas

Antologias Virtuais Permanentes:
• Portal CEN (Cá Estamos Nós - Brasil/Portugal)
• Logos do Portal Fénix (Brasil/Portugal)
• Revista eisFluências (Brasil/Portugal)
• Jornal Correio da Palavra (ALPAS 21)

Concursos, Projetos e Afins:
• Menção Honrosa do 2° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Brava Gente Brasileira”.
• Menção Honrosa do 4° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Amor do Tamanho do Brasil”.
• Menção Honrosa do 5° Concurso Literário Pague Menos, de nível nacional. Ficou entre os 100 primeiros e está no livro “Quem acredita cresce”.
• Menção Honrosa no I Prêmio Literário Mar de Letras, com poetas de Moçambique, Portugal e Brasil, ficou entre os 46 primeiros e está no livro “Controversos” - E. Sapere
• classificado no Concurso Novos Poetas com poema selecionado para o livro Poetize 2014 (Concurso Nacional Novos Poetas)
• 3° Lugar no Concurso Literário “Confrades do Verso”.
• indicado e outorgado com o título de "Participação Especial" na Antologia O Melhor de Poesias Encantadas/Salvador (BA).
• indicado e outorgado com o título de "Talento Poético 2015" com duas obras selecionadas para a Antologia As Melhores Poesias em Língua Portuguesa (SP).
• indicado e outorgado com o título de Talento Poético 2016 e 2017 pela Editora Becalete
• indicado e outorgado com o título de "Destaque Especial 2015” na Antologia O Melhor de Poesias Encantadas VIII
• Revisor, jurado e coautor dos tomos IX e X do projeto Poesias Encantadas
• Teve poemas selecionados e participou da Coletânea de Poesias "Confissões".
• Dois poemas selecionados e participou da Antologia Pablo Neruda e convidados (Lançada em ago./14 no Chile, na 23a Bienal (SP) e em out/14 no Museu do Oriente em Lisboa) - pela Literarte

André Anlub por Ele mesmo: Eu moro em mim, mas costumo fugir de casa; totalmente anárquico nas minhas lucidezes e pragmático nas loucuras, tento quebrar o gelo e gaseificar o fogo; não me vendo ao Sistema, não aceito ser trem e voo; tenho a parcimônia de quem cultiva passiflora e a doce monotonia de quem transpira melatonina; minha candura cascuda e otimista persistiu e venceu uma possível misantropia metediça e movediça; otimista sem utopia, pessimista sem depressão. Me considero um entusiasta pela vida, um quase “poète maudit” e um quase “bon vivant”.

Influências – atual: Neruda, Manoel de Barros, Sylvia Plath, Dostoiévski, China Miéville, Emily Dickinson, Žižek, Ana Cruz Cesar, Drummond
Hobbies: artes plásticas, gastronomia, fotografia, cavalos, escrita, leitura, música e boxe.
Influências – raiz: Secos e Molhados, Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Mutantes, Jorge Amado, Neil Gaiman, gibis, Luiz Melodia entre outros.
Tem paixão pelo Rock, MPB e Samba, Blues e Jazz, café e a escrita. Acredita e carrega algumas verdades corriqueiras como amor, caráter, filosofia, poesia, música e fé.