As Moedas Na Rua E O Dia Intenso No Álcool
Acordou de um porre, tomou uma ducha boa para tirar a catinga de ontem, colocou uma boa bermuda, camisa de Hering branca; colocou o tênis com meia grossa e a carteira no bolso com apenas dois reais. Saiu na secura, na abstinência pura, mão trêmula e olhos acirrados nos bares do caminho. Pegou a rua Siqueira Campos lá em cima, bem na boca do túnel... Veio descendo... Deu bom dia a uns porteiros, a um rapaz que trabalhava de bicicleta triciclo em entregas; deu bom dia ao dia e bebeu sua primeira logo no primeiro boteco:
- Bom dia Reinaldo, meu caro! Hoje estou mal, a cabeça parece um sino! Coloca um real de pinga, no capricho aí, por favor.
- Bom dia André, você está sempre assim – disse Reinaldo abrindo um sorriso discreto e parando de enxugar um copo americano com um pano velho e já rasgado. – Tem uma mineira nova e boa que chegou ontem; já vendi uma garrafa em menos de seis horas -
Bebeu, já se foi um real, e seguiu seu rumo... Passou em um bar conhecido, logo ao lado do que havia acabado de sair. Procurou algum amigo de copo, nada. Afinal eram oito da manhã de um dia quente de segunda. Bebeu seu segundo real:
- Fala seu Carlos, como vai essa força?
- Tudo em paz meu jovem!
- Coloca um real da forte ai. No capricho, por favor.
Por um momento lembrou de como tudo começou, lembrou de pequenos goles nas bebidas quentes no Natal e nos sorrisos estampados nos rosto sob o efeito corrosivo e impulsivo do álcool. Tudo era festa na terra do Deus dará. Lembrou-se de um dia, ainda muito novo, voltando da praia e encontrando uma turma mais velha bebendo chope em uma birosca local; parou e lhe deram uma tulipa, logo depois todos beberam uma ‘branquinha’ e o embalo acabou por ai. Não foi correr atrás de mais, tampouco deu secura, foi para casa assistir um bom filme e desmaiar na cama quente. Mas, voltando ao bar:
E então o copo quase cheio... Essa talagada demorou um pouco, foi em longas bicadas, pois veio logo o que já estava a prever: o enjoo. Respirou fundo, foi para a porta do bar quer o tempo fosse curto, quer o efeito da cachaça não fosse ligeiro e o vomito viesse. Inspira – expira –, deixa o álcool ir para o sangue... Em trinta segundo já começa a vir um falso bem-estar, a ansiedade cai repentinamente e ele se alegra, e ele abre um tímido sorriso e puxa assunto com o velho Carlos (dono do Bar). O assunto estava bom, mas a luta continua. Tinha que ir à caça de mais álcool, de mais antídoto do mal-estar, da abstinência, da sensação ruim de estar sóbrio. Desceu a Siqueira Campos e passou em outro bar, do outro lado da rua. Lembrou-se que já andou muito por ali a pé e de bicicleta, quando era guri e mesmo depois de mais velho. Entrou no boteco e não encontrou ninguém conhecido. Havia um rosto conhecido, bebendo no fundo do bar, mas como não gesticulou e não reparou nele, ele deixou para lá. Desceu a rua pensando se ia à praia ou voltava para casa e descansava. O dinheiro estava zerado e sua última esperança era um barzinho que frequentava com afinco entre as ruas Ministro Alfredo Valadão e Joseph Block. Antes mesmo de chegar ao destino, na esquina da Alfredo com a Siqueira, bem em frente à travessa Santa Margarida, viu um carro saindo da vaga e surgindo aos olhos um brilho intenso; era como uma alucinação momentânea, algo surreal; de repente era como se estivesse em um sonho, quiçá pesadelo, muito bem-vindo. Estavam ali, no chão, várias moedas espalhadas; moedas de dez, vinte e cinco e cinquenta centavos; achou também quatro moedas de um real... foi catando uma por uma, olhando para os lados, desconfiado...
(continua)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Agradecemos pela leitura.