Dueto da tarde (CLXXXIII)
O cianureto percorre os versos no
coreto, no correto de um soneto que envenena todo o mal.
Mal e mal envenenado, o mal-estar do mal
versado invade o verso, perverso, e ri como um demente.
Vai verão – vem verão, vão-se os caroços
de feijão e ficam os dentes; morre a intenção de jogar água fria ou colocar
panos quentes.
Fantasias rasgadas e jogadas no fogo.
Jogo com novas regras: se pregas o esquecimento, esqueça!
Vai inverno – vem inferno, vão-se os
talentos que estavam lentos e ficam os talos azedos; morre o arremedo de um
sonho bom.
Bom é sonhar que o sonho nunca acaba. O
que acaba em travesseiro babado de lágrimas e de frustração.
Bom é saber que o sonhar e o voar dormem
acordados, e são palpáveis e podem pousar suaves na realidade. Basta tirar o
brevê de piloto.
Quer voar? Voa. Mas não vem aterrissar
na minha fronha, diz o travesseiro babado de frustração.
Quer versar, verse; quer prosar, prose.
Mas me empreste esse veneno para matar meus cupins, diz o coreto com
“osteoporose”.
Quer misturar tu com você? Fica à
vontade: é tudo nós mesmo. É tudo ir embora ficando e ficar indo embora.
O voo aterrissa em completo segredo, e
arrisca sem medo acordar o sonho o tu e o você. Todos acordam indecisos,
remelentos, e não dão corda para o que veem.
A corda acorda o enforcado. Pelo menos é
o que ele pensa, antes do cianureto.
Rogério Camargo e André Anlub
(20/6/15)
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