Segurei na mão do meu avô
Miles Davis em volume máximo
fones nos ouvidos
O trompete fazendo as orelhas arderem
confusos aforismos.
Imagens brotam agora
já estava na hora
de uma longa estrada de terra
estreita e velha
com flores na beira
o que vier na telha.
E os ritmos dos assovios
espalham-se aos montes
com a música do momento
na companhia do meu avô.
Meu avô era um homem de bom coração
com suas cicatrizes de vida
encarcerado pela labuta
vivia na transmuta
ruim – bom – sã – não.
Já não interessava onde estou ou vou
logo fechará no chover
sentados em pequeno bar
cerveja gelada em uma mão
na outra a cuia de tacacá.
Conversa-se sobre amores
sobre a cidade de Belém
das redes nas tardes chuvosas
das mangueiras generosas
entre, entre e entre
um gole e outro
passam faróis dos carros
passam pessoas com olhares vagos
passam formigas e besouros
passa o tempo apressado
o lamento do andar do ponteiro
íamos nos separando
eu triste e desesperado
mas entendendo a efemeridade
desse raso momento.
Segurei na mão do meu avô
lembrei-me que ele já havia partido.
André Anlub®
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